domingo, 3 de junho de 2007

Episódio 1 - O reencontro

Argumento: Felipe Aires e Milton Figueiredo

Escrito por: Milton Figueiredo




Fazia um calor infernal em São Paulo por volta das 15 horas. A poluição e o ar seco prejudicavam a respiração de Gilson, que tinha bronquite. Para ele, seria muito difícil se acostumar em viver na metrópole. Fazia cerca de um mês que ele chegara de sua cidade natal Barretos, cidade do interior do estado, conhecida por ser a Capital Nacional do Rodeio.
Gil, como era chamado por todos, recebera uma oferta de emprego em uma grande e renomado colégio da capital para ministrar aulas de Filosofia. Ele fora seminarista, mas, mesmo assim, teve sempre a convicção de sua sexualidade. Desde muito pequeno percebia que era diferente dos demais garotos, pois distintamente deles, gostava dos meninos e não das meninas. Apesar de muitos pensarem que ele estivera num seminário para abafar sua sexualidade homossexual, ele acreditava que tinha sim vocação à vida sacerdotal, entretanto, nunca ao celibato. Permaneceu no seminário até o início da Teologia, mas logo “desaquendou”, e partiu em busca de novos projetos de vida. Já não agüentava mais viver no meio de tanta hipocrisia.
Mas foi na época de seminário que ele conhecera dois grandes amigos, Henrique e Carolline. Na época, ele ministrava catequese em preparação à Crisma para os dois. Depois de anos de convivência, eles se separaram. Henrique se mudou com os pais para Presidente Bernardes e Gil se mudara para Ribeirão Preto para continuar seus estudos no seminário. Apenas Carolline continuou a viver em Barretos. Desde então, trocaram alguns e-mails, mas nunca mais se encontraram. Gil encontrou por acaso Carolline umas duas vezes em Barretos, mas só. Cada um tinha tomado um rumo diferente e o círculo de amizades também eram outros.
Voltando ao presente, Gil já procurara diversos apartamentos para alugar, mas até então, nenhum havia se concretizado. Saindo do colégio, depois de uma exaustiva aula para uma classe de oitava série, ele passou numa banca de revistas. Viu a capa do modelo da G Magazine do mês, mas não o agradou. Depois, viu os DVDs a venda. Ainda eram os mesmos do ano passado. ”Por que será que eu ainda passo nessa banca tao preconceituosa heim”, pensou. “Os DVDs e as revistas gays ficam sempre no alto e escondidas”.



Mas, ele pegou o jornal, pagou e sentou-se num banco de uma praça para dar uma olhada nos classificados.
- Hum, esse parece ótimo, é perto daqui.
Gil, então, se levantou e se dirigiu até o endereço do apartamento. Antes, passou numa padaria e comprou uma tortinha de morango. O creme da torta estava tão mole que por duas vezes quase caiu no chão.
- Boa-tarde senhor! – disse ao porteiro do prédio.
- Boa-tarde!
- Eu vim por causa do anúncio do jornal, tem um apartamento pra ser alugado aqui...
- Ah sim, sei, é o apartamento 115, no terceiro andar – disse o porteiro lindinho, e que devia ser nordestino pelo sotaque.
- No classificados diz que o aluguel deve ser tratado com o próprio proprietário...
- É, é sim. Com o sr. Daniel. Ele é o cara mais rico do prédio. Se você se mudar pra cá, toma cuidado, ele é “viado”, vive cantando todos aqui do prédio. Eu mesmo não comi porque não curto sabe, dizem que ele paga bem, mas sei lá, bunda cabeluda não é comigo não, e ele é todo peludão...
- Ah, ta, ele é gay! – disse Gil segurando a risada – Pode deixar, eu vou tomar cuidado. Mas, qual é a idade dele?
- Acho que uns trinta anos.
“Hummmmm, trinta anos, my God do céu” pensou Gil que adorava caras mais velhos que ele.
- Bom, então você pode me anunciar?
- Ah, tá, pode ir subindo, ele tá sozinho agora. O apartamento dele fica no quarto andar, apartamento 222.
- Valeu, obrigado!
Gil apertou o botão do elevador que se encontrava no décimo andar.
Na mesma hora, um moça, entrou toda estressada e disse ao porteiro que queria ver o apartamento que estava no anúncio do jornal.
- Aquele rapaz ali tá indo pra lá, é só acompanhar ele.
- Valeu – disse a moça.
- Vixe Maria, essa aí se duvidar é mais cabra macho que eu! – pensou alto o porteiro.
O elevador estava descendo. Gil continuava a comer a tortinha de morango e a moça “cabra macho” remexia sua mochila toda estressada. Um outro rapaz chegou antes que o elevador chegasse ao andar procurando falar com o proprietário do apartamento 115. O porteiro olhou esse de cima abaixo, segurou o riso e disse que aquele cara e aquela “moça” (ele enfatizou moça) estavam indo pra lá, que era só acompanhá-los.
O rapaz agradeceu e se dirigia ao elevador que se abria. Saíram duas velhas senhoras conversando sobre o capítulo da novela das nove da Globo. Gil entrou e ao entrar deixou cair o resto da torta no chão. A moça entrou mais estressada ainda porque o cara estava demorando para sair da sua frente. O outro rapaz, que também estava de mochilas pegou uma revista de moda e entrou sem olhar para os dois. Nenhum dos três teve a curiosidade de olhar para o outro. O rapaz só não encarou Gil porque lá na portaria, havia achado as roupas dele caretas demais, e ele curtia carinhas mais novos e mais descolados.
Por fim, o elevador chegara ao quarto andar. A moça saiu estressada como sempre e tirando das orelhas o MP3. Gil se abaixou para tentar limpar mais uma vez o resto da torta que tinha caído. O rapaz saiu, tentando enfiar a revista na mochila. Desistindo de limpar o chão, Gil seguiu os outros dois. O rapaz que tentava enfiar a revista na mochila não percebeu o vaso em sua frente e tropeçou, caindo.
- Ai meu Deus, era só o que me faltava! – disse para si a moça.
- Você se machucou? – perguntou Gil ao rapaz que caíra de cara no chão e tentava se levantar.
- Ai, não, valeu! – disse se levantando. Aí, espantado, ao mirar Gil exclamou alto – Gil, é você?
- Não acredito, Henrique!
- Ah não, acredito, vocês dois aqui!?
- Carolline! – disse surpreso Gil olhando para trás – Não acredito que depois de tanto tempo a gente se encontre em São Paulo. Que saudades gente! – e logo abraçou Henrique.
- Nossa, eu também!
- Gente eu achava que nunca mais ia ver vocês! – disse Carolline enquanto era abraçada pelos dois.
- Mas, e aí, o que vocês estão fazendo aqui em São Paulo?
- Ah, Gil, até que enfim eu me aceitei. Resolvi viver a minha vida, sem ter pai e mãe me controlando. Não dei tempo nem pra eles me xingarem, assim que contei, peguei minhas coisas que já estavam na mala e vazei. Cheguei ontem, tava num hotelzinho aqui perto. Ai, que saudades! – disse ele todo fresquinho abraçando mais uma vez os dois amigos.
- E você Carolline?
- Ah, eu me formei ano passado em enfermagem. Conheci uma garota pela net, e resolvi vir pra cá. Ele conseguiu emprego pra mim num pronto socorro de um hospital público, e to lá há uns três meses já. A gente brigou, e eu tô procurando um lugar pra alugar. Já tirei minhas coisas de lá, também to num hotel aqui perto. E você meninona, o que faz aqui em São Paulo?
- Já é “padra” já? – perguntou Henrique.
- Não, não! Tem um tempão que eu saí. To aqui em São Paulo porque fui convidado a dar aulas de Filosofia num colégio, To aqui há um mês mais ou menos, mas não acho um lugar legal pra alugar também. Aí hoje, vi no jornal que tinha um apartamento pra ser alugado aqui.
- Não me fala que é o apartamento 115?
- É, por que? Vocês também tão atrás dele?
- É claro, e eu cheguei primeiro heim!
- Que nada Carolline, eu cheguei primeiro! Só não sai primeiro que você do elevador porque tava tentando limpar o chão!
- Nem vem! Mas quem chegou primeiro na porta do proprietário fui eu.
- Hummm, sapinha nervosa você heim! – disse Henrique de braços cruzados e fazendo biquinho.
Na mesma hora, a porta do proprietário de abriu.
- Boa-tarde! O porteiro me avisou dizendo que vocês três estavam subindo.
- Mas olha, eu cheguei primeiro, então a prioridade é minha viu! – disse depressa Carolline.
- Não faz dá uó sapinha! Vai ficar com o apartamento quem tiver mais grana pra pagar.
- Não, mas, infelizmente, não vou poder alugar o apartamento pra vocês, acabei de fechar o aluguel por telefone. Uma senhora que veio ontem ver o apê decidiu alugá-lo. Sinto muito.
- Ah, não acredito! Esse parecia ser tão bom pra mim, pertinho de onde trabalho.
- Ah, e pra mim, era ótimo pro meu bolso até eu conseguir arrumar um trampo.
- Mas, olha, eu tenho um outro apartamento, no mesmo andar, o apartamento 111. a reforma terminou hoje cedo e eu ia colocar anúncio no jornal amanhã, só que este apartamento tem uma suíte e dois quartos.
- Ah, acho ótimo, já que o destino uniu a gente de novo, acho que a gente podia dividir esse apê, não é ótimo, o que acham?
- Acho que é uma boa Henrique!
- Ah, que uó! Não me chama de Henrique não, me chama a partir de agora de Rick, fica mais fashion, mais atual, mais clean.
- Ta bom “Rick”, acho ótimo, por mim tudo bem. E você o que acha Carolline?
- Carolline também não né, é um nome muito feminino pra ela. Line! A partir de agora você ta batizada de Line! Hahahah! A nossa Linão!
- Ah, sei lá, pode ser, já que não tem tu, vai tu mesmo né.
- A gente pode dar uma olhada no apartamento? – perguntou Gil que estava encantado com a beleza do proprietário.
O apartamento era amplo, de fato estava novinho. O apartamento tinha uma suíte, dois quartos e um banheiro social, uma sala grande, uma cozinha e uma pequena área de serviço e uma sacadinha.
- Adorei! – disse Gil.
- Amei! – disse Rick.
- É, ta bom sim! – finalizou Line.
- E então, fechamos negócio?
- Por mim tudo bem.
- Por mim também – concordou Rick com Gil.
- Bom, então, eu vou até a minha casa buscar o contrato. Fiquem a vontade.
- Certo!
O proprietário saiu e os três ficaram por ali.
- Gente, sabe o que eu lembrei agora?
- O que?
- Ah Line, do dia em que a gente se conheceu!
- Ah Rick, sessão túnel do tempo agora é?
- Ah Gil, sinto saudade daquela época. Ai, nossa, tinha o Renato, que lindo meu Deus, que delícia.
- Eu ainda tinha a esperança de ver vocês “duas” se arranhando por causa do bofe – disse Line.
- Imagina, não catei porque não quis.
- Ah Gil, nem vem!
- Mas é Rick, lembra quando estivemos naquele retiro? Eu e eles ficamos no quarto, e ele tava com uns papos bestas, mas aí, quando eu achei que podia dar o bote, ele recuou, aí resolvi abafar o caso.
- Hummmm, billlll, lembra que no mesmo dia eu vi o “necão” dele no banheiro? Só não sentei ali no chão e fiz uma “sangue suga” porque eu ainda vivia trancadinha no armário.
- Ah, o Renato ta casado hoje. Ahhh, ele casou com a Maria Paula, que era da nossa turma de crisma.
- Fala sério Line! Babado! – disse Rick todo passado – Mas, gente, nossa turma de crisma era do babado, e a Gil aí catequisou a gente direitinho né?!
- Até parece né. Assim você vai dar razão pra esse povo que diz que homossexualidade é opção de vida - disse Gil magoado.
- Não fica magoadinha não amore! – disse Rick fazendo biquinho e abraçando Gil.
- Não vem melando agora não!
- Hummm, ta começando já o romance das duas florzinhas! Me poupem, espera cada uma de vocês terem o quarto de vocês.
- Ai Linão, que uó! A Gil vai ser como uma mãe pra gente!
- Nossa, bicha maligna, me chamou de velha!
- Calma Gil, mas é verdade, sempre foi o mais velho que nós duas aqui. Desde o dia que a gente se conheceu na missa de Santo Antonio!
- Ah, nem lembra isso Rick!
- Por que não Line? Achei digno a gente se conhecer lá. Mas, bem que a Gil aqui nem podia tá lá pedindo pra santinha namorado né! Ela já era seminarista!
- Afff, e porque não? Também era filho de Deus naquele tempo Rick! E tenha mais respeito pelo Santo. Não é porque você é quase uma flor de altar que vai ficar chamando-o de santinha. Nem todo mundo é gay viu.
- Nem todo mundo, tem razão, mas a maioria. Principalmente esse povinho de igreja.
- Meninas, por favor, papo clerical agora não. Gil nem é mais seminarista, nem tem mais nada a ver.
-É verdade Line, deixa esses assuntos de Igreja pra lá. Cada um sabe o que faz da sua vida. Se a Igreja acha que ainda é melhor não aceitar os atos homossexuais, até mesmo dentro da igreja, é problema deles. Eles sabem o porquê fazem isso.
- Ta certo, ta certo! Mas,bem que a senhora ganhou um bofe do santo né!?
- E aí, vocês terminaram Gil?
- Ah Line, a gente ficou junto por uns dois anos, mas aí, depois que ele se ordenou padre, a distancia e os trabalhos pastorais dele nos impediam de se ver. Fora que ele vivia me traindo né. Não dava mais certo.
- Babado! Namorar um padre, afffff! Que excitante!
- E você heim Rick, quem te viu e quem te vê. Olha, nas duas vezes que eu encontrei o Gil lá em Barretos, a gente se perguntava se você um dia ia sair do armário. E escancarou de vez né!
- Ai Linão! A vida é tão curta! É tão curta quanto aquela auxiliar da Gil na crisma que você disse na época que tava apaixonada!
- Nossa Rick, é verdade, me lembro da menina vindo em contar desesperada, pedindo pra que eu conversasse com a Line.
- De quem você tão falando, boiei!?
- Da Lili, aquela japonezinha baixinha, que era auxiliar da Gil na época que ela dava crisma pra gente.
- Ah ta, lembrei. Ela fez cu doce, mas depois de uns dois anos beijei ela.
- Não acredito! – disse Gil.
E o papo acabou sendo encerrado com a entrada de Daniel, o proprietário do apartamento 111. acertaram tudo com ele, que se despediu, apertando firmemente as mãos de Gil e Rick.
- Apareçam lá em casa qualquer horas dessa, pra gente bater um papo, tomar um vinho!
- Pode deixar Daniel, a gente vai sim! Obrigado! - disse Gil que fechou a porta após fazer um tchauzinho pra ele e quase se desmanchou na porta.
- Hummm, paixão à vista Rick!
- Olha só Gil, você só vai poder ficar com o bofe porque ele é peludão demais e muito velho pra mim.
- E você ta me chamando de velho mais uma vez?
- Não bil, a senhora me entendeu!
- Ah mas, usando essas roupinhas aí em Gil, uó!
- Ah Line, você não queria que eu fosse dar aulas com o mesmo visual que o Rick não é mesmo?
- O que tem omeu visual? Affff! Tô loca!
- Não tem nada Rick! É que assim, deixaria claro pra todo mundo que sou gay!
- Mas e você não é? Vivia me criticando porque eu negava que era gay e agora vai me jogar pedras porque me assumi, por causa das roupas que uso?
- Claro que não Rick! Você tá lindo assim! É que não dá pra ir lá assim né, não se esqueça que o preconceito existe. Não é que eu quero esconder a minha sexualidade, mas também não acho que através das minhas roupas e do meu jeito de falar com as pessoas, tenho de deixar claro que sou gay.
- Gente! Agora é a minha voz, o meu jeito de falar que você vai criticar?
- Ihhhhh, to até vendo o que essa convivência vai render – disse Line – Mas galera, olha só! A gente tem que decidir quem vai ficar com a suíte.
- Eu!
- Por que você Rick?
- Porque eu vou precisar mais de privacidade que vocês duas, horas bolas! To em faze de cassação, não vão querer ver os bofes andando pela casa pra ir ao banheiro né?
- Gente, desbundou de vez mesmo heim!
- Ahhh, outra crítica! Que uó você heim! Não é porque eu disse que você é como uma mãe pra gente que você vai se achar no direito de controlar as minhas fodas!
- Longe de mim bichinha no cio. Fica tranqüila! Só se lembre de usar a camisinha. Mas do jeito que anda, é capaz de transar com o cara ele ainda estando vestido com a calça.
- Gente, ela tirou o dia pra me apedrejar!
- Não, gente! Pára! Parou! Quem vai ficar com a suíte?
- Já sei! Já que essa aí ta me criticando, quero propor uma coisa.
- Fala Rick – disse Line.
- Quem de nós três chegar primeiro com um acompanhante, fica com o quarto. Quero só ver se essa aí, vestida assim vai conseguir arrumar um bofe primeiro que eu.
- Ah, é guerra é?! Eu topo!
- Certo garotas, conheço uma balada aqui perto! Não é GLS, mas vive cheio de gays e lésbicas lá. Agora são quatro e quinze. A gente pode ir buscar nossas coisas e nos arrumar aqui. Mas, ninguém toma banho na suíte, vamos deixar que o vencedor da noite faça a estréia em grande estilo.
- Certo, fechado! Que vença a melhor! – disse Rick.


Os três saíram rapidamente do prédio. Cerca de duas horas e meia depois, os três se encontravam novamente no apê 111, que nunca mais seria o mesmo após este reencontro. Às dez horas em ponto, Line saiu do banheiro social arrumada, perfumada. Gil e Rick a esperavam calados na sala.
- Que bom que o apê já tinha alguns móveis, a gente não vai ter que comprar muita coisa.
- É! O Daniel disse que antes de nós, vivia um casal de idosos aqui, e os filhos resolveram deixar tudo após a morte deles. Diz ele que os dois foram atropelados pertinho daqui. Morreram os dois na hora!
- Só você mesma pra falar em morte numa hora dessas né Gil?
- Ai Rick, o que tem, só estou comentando.
- Bom, estamos todos prontos, vamos à caça meninas!
- E que vença a melhor!
- E que vença a melhor – concordou Gil com Rick.
- Mas eu vou ficar com o quarto! – disse Rick.
- É o que você pensa sua franguinha mal nascida! – disse Gil.
- Olha, não quero estragar esse momento Xena com vocês não, essa guerrinha, mas meninas, quem vai ficar com esse quarto sou eu!



Na balada, cada um tentava desesperadamente encontrar o seu par. Podia até ser “feinho” ou “feinha”, não importava. O que importava era chegar em casa primeiro, tudo para poder ter mais privacidade nas horas “h”.
Line estava procurando alguém que lhe retribuísse o olhar para cair de cima. Até que uma menina loirinha lhe mirou, sorriu e abaixou a cabeça.
- É essa! – disse Line e indo até a garota.

- Hã, então você só tem uma das bolas, ah ta, sem problemas! – disse Rick para um cara lindíssimo com quem dançava e usava óculos.

Só Gil ainda parecia não ter encontrado ninguém, até que esbarrou num bofe que vestia camiseta preta, quase que derrubando o uísque nele.
- Opa, desculpa! Não tive a intenç... Marco Aurélio! Que surpresa encontrar você por aqui!
- Gil, nossa, nem eu esperava encontrar você aqui! Não que eu esteja aqui caçando sabe, tenho namorada, você sabe, mas é que uns amigos me disseram que aqui tem uma balada legal, um povo sem preconceitos, e aí resolvi acompanhá-los.
- Não entendi muito bem o que você quis dizer, mas olha, nem to interessado se você “curte” ou não, se prefere ser ativou ou passivo, se é sado ou masoquista – Marco Aurélio quase engasgou quando ele disse isso -, eu só queria que você me ajudasse numa parada aí.
- Tá, tá, pode dizer, se puder te ajudo sim claro! Desde que ninguém do colégio fique sabendo que a gente se encontrou aqui...
- Fica frio! Deixa eu te contar... É o seguinte...

Dez minutos depois, os três mais seus pares entupiam o elevador.
- Gente, eu cheguei primeiro! – disse Gil.
- Não faz dá uó não girafa! Quem chegou aqui primeiro foi eu com meu bofe!
- Meninas, desculpa, mas a gente vai ter que resolver isso quando sairmos daqui.
Eles saíram do elevador. Aliás, parecia que o elevador havia vomitado eles para fora.
- Proponho o seguinte, de nós três, quem chegar na porta primeiro, fica com a suíte.
- Nem vem Line, não quero que vocês me empurrem, a Gil é má mas você tem mais força que nós duas juntas.
- Vamos tirar a sorte no palitinho!
- Não Gil, toda vez é você quem ganha.
- Então o que você propõe Rick? Rick, eu tô falando com você!
- Gil! Veja! – disse Line.
- O quê?
Os três acompanhantes se pegavam dentro do elevador que começava a se fechar.
- Não acredito no que tô vendo! Eiiiiiiii, volta aqui! Esse aí de óculos só tem uma das bolas! – gritava Rick ao elevador que descia.
- Galera, tô passada! Que menina foda meu! Ficar de uma vez só com os dois! Não era menina pra mim mesmo! Eu nunca consegui ficar com um, imagina se ficaria com dois ao mesmo tempo. Eca!
- Bom, estamos no dilema de antes: quem vai ficar com a suíte?
- Ai Gil, sinceramente nem sei mais o que pensar. To passada! Tomara que na hora do “vamô vê”, ele perca a outra bola.
- Rick, não é hora de você ficar jogando praga no coitado do bofe né! Os culpados somos nós mesmos que não fomos capazes de resolver isso civilizadamente. Você aceitou sair com um bofe que tinha uma só bola, eu com um companheiro bissexual de trabalho que deve ser figurinha fácil na balada e a Line com uma menina mal resolvida por causa de uma suíte. A que ponto chegamos. Já sei então, vamos entrar!

No apartamento, os três estão sentados no sofá.
- Proponho o seguinte então. Já que vamos dividir as contas, nossas vidas, proponho que apresentemos nossa renda mensal, e aquele que ganhar mais no mês, ficará com a suíte, já que será essa pessoa que vai poder ajudar mais nas contas.
- Sua vagaranha, espertinha! Eu vou viver de uma mísera renda até conseguir emprego, não tenho ainda uma renda.
- E eu, trabalho num P.S. de um hospital público, não ganho tão bem assim, quer ver meu holerite, recebi hoje o salário...
Ela pegou o holerite e pos na mesinha ao centro da sala. Depois, Gil pegou o seu e colocou do lado.
- Xeque-mate! Desculpem meus bebezinhos, mas quem vai por mais comida dentro dessa casa, é a mamãe aqui, então, a suíte é minha.
- Não acredito que até mesmo numa série virtual sobre gays a hierarquia social vá prevalecer.
- Rick meu bem, infelizmente é assim, manda quem tem mais grana. Agora com licença, vou levar minhas malas pra minha suíte e tomar um belo banho de banheira, aproveitando esta noite calorosa. Pena não poder ter um acompanhante, mas fazer o que? Não há de faltar oportunidades.
Depois disso, Gil pegou suas coisas e se trancou no quarto.
- Essa bicha uó há de me paga. Ele vai ver só.
- Que nada Rick, infelizmente é assim mesmo. E foi você mesmo que disse que ele será como uma mãe pra nós, que é o mais velho e tal, então não adianta reclamar. Afinal, ele vai ter mais grana mesmo pra por comida dentro de casa e pagar as contas. Mas olha, veja o lado bom das coisas: a gente já sabe a quem recorrer na hora do aperto.
- Tem razão “papatão”, não tinha enxergado a situação por este ângulo. Heheheh! Bom, então, vamos nós comemorar a inauguração desse apê, com bofes, rãs, amapolas ou não. Vou mostrar pra você a coreografia que eu to preparando pro meu primeiro show de drag. Liga aquele radio ali pra mim enquanto pego meu cd dentro da mochila.

Enquanto Rick e Line se divertiam na sala, dando altas risadas, Gil tentava relaxar na banheira de hidromassagem. Mas, a alegria dos dois, as risadas lhe incomodavam.
- Por favor, será que dá pra vocês abaixarem essa música? Se ainda fosse uma música da Thalia, mas essa aí? Uó, uó!
- Ah sô! Enfia a cabeça dentro da água pra não ouvir, e aproveita e vê se encontra sua “nequinha” lá debaixo! – disse Rick.
Rick e Line riram até sair lágrimas dos olhos. Gil ofendido voltou para a banheira. Entretanto, eles sentem a falta de Gil na sala e Gil sente a deles na banheira. Afinal de contas, era o reencontro deles e a primeira noite deles no apartamento.
- Ah, bem que o Gil podia estar aqui com a gente! É nossa primeira noite juntos.
- É verdade Linão! Mas eu que não vou descer do meu orgulho e ir lá chamar a grandona uó!
- Ah isso é verdade. Se ele quisesse a nossa companhia, tinha vindo pra cá!
- Eu, pelo contrário, vim chamar vocês pra irem pra lá comigo. A banheira tá muito vazia! – disse Gil que entrava na sala com a toalha amarrada abaixo do peito como uma mulher faz ao sair do banheiro.
- Ah amiga! Que gracinha! – disse Rick indo abraçar o amigo Gil.
- Eu sabia, uma mãe nunca deixaria os seus filhos órfãos! Heheh – e também abraçou Gil. Os três permaneceram abraçados por alguns instantes.
- Gente! Ta calor, helloooooo, a gente não tem uma piscina, mas temos uma banheira fresquinha lá no meu quarto nos esperando.
- Vamô botar fogo naquele puteiro! – disse Rick pegando rádio e levando para a suíte de Gil.
Lá, na banheira, os três relembraram os velhos tempos, a missa em que eles se conheceram e a turma de crisma. A partir daquele dia, a vida deles nunca mais seria a mesma, pois eles nunca mais conseguiriam viver longe um do outro. A vida dos três estava cela pelo xixi que os três fizeram na banheira de tanto rir.
No rádio, tocava a música Alegria e Rick resolvera fazer um showzinho:
“Eu sou a piranha do banheiro... samba, meu corpo é o carnaval, eu sou a piranha, eu sou o pecado, a vergonha.. vagabunda! Piranhaaa!
A empolgação foi tanta que ele se levantou da banheira. Na mesma hora, Line tapou o rosto e Gil tapou a boca estático, pois estava surpresa com o tamanho da “neca” de Rick. Será que era grande demais ou pequena demais? Ihhhhh, se joga nessa história que um dia, quem sabe, você vai descobrir.

Comente o episódio. A partir do quinto episódio você poderá contribuir com temas para as aventuras dos três amigos e o seu nome será divulgado.

quarta-feira, 23 de maio de 2007

Sinopse

Após 6 anos sem se verem, os amigos homossexuais, Gil, Rick e Carolline se reencontram diante de um apartamento, no qual, os três estão afim de alugar após um anuncio de jornal. É evidente a mudança de Rick e Carolline. Ele enfim assumiu a sua homossexualidade, e até demais, e Line (como era chamada por eles) está mais homem em suas atitudes, que os próprios Rick e Gil.
No passado, os três se conheceram numa igreja, em pleno dia de Santo Antonio. Gil era seminarista na época e os outros dois estavam na missa pedindo a intercessão do santo para arrumarem namoro. A partir daí, os três ficaram amigos inseparáveis, ou pelo menos quando Gil podia deixar as atividades do seminário para estar com eles. Naquela época, Line estava se descobrindo gay e Rick se negava até debaixo d’água. Mesmo Gil sendo seminarista, tinha convicção de sua sexualidade, e era ele quem ajudara os dois a se aceitarem.
Os anos se passaram, e cada um tomou um rumo diferente. Gil fora para um seminário em outra cidade continuar seus estudos; Rick se mudou com os pais, para outra cidade também; e Line fora fazer faculdade.
Hoje, Gil não é mais seminarista e nem se ordenara padre. Agora, ele é professor de Filosofia em um colégio particular, e não tem sorte no amor. O que ele mais faz nas horas vagas, além de ser “mãe, psicólogo e padre confidente” dos amigos, é marcar encontros em salas de bate papo, o que nem sempre dá muito certo.
Line é enfermeira num hospital público e vive frustrada, pois só se apaixona por mulheres heterossexuais. É a mais “estouradinha” do trio e isso muitas vezes lhe causa sérios problemas.
Rick, que faz questão que todos saibam de sua sexualidade, vive trocando de emprego e de namorado; na verdade, ainda não sabe que rumo tomar na vida.
Agora, juntos novamente, eles decidem dividir o apartamento, seus temores, alegrias, frustrações e tristezas e amores. O prédio em que vão morar e a cidade de São Paulo nunca mais serão os mesmos após o reencontro dos três, onde quase sempre, tudo termina numa grande confusão.